Não
existe jornada que seja feita em linha reta. Você começa em algum lugar, tendo
claramente em vista o seu objetivo. Durante algum tempo você segue nesse
caminho, determinado a chegar ou lá. Mas não demora muito e você logo se depara
com uma curva, com uma ladeira íngreme para cima ou para baixo, alguma enorme
montanha onde você precisa decidir se escala ou dá a volta ao redor, um rio, um
lago ou o próprio mar. São obstáculos, barreiras, impedimentos. Mas você
continua. Sempre vai, afinal a vida é uma grande jornada que só termina no
nosso último suspiro.
Quando
começa a sua própria jornada, você tem as suas convicções, suas certezas e suas
ambições. Os primeiros passos são decididos, firmes e inabaláveis. Então chegam
os obstáculos. Você é obrigado a parar e pensar: o que é melhor fazer aqui e
agora? As certezas esmorecem, os passos titubeiam e as dúvidas crescem passo
após passo. Esses obstáculos fazem você mudar, não necessariamente para melhor
ou para pior, apenas mudar. Amadurecer, talvez, ou talvez não. Mas você vai
mudar, o tempo todo, mesmo que você nem note ou não queria admitir. A vida é
assim, uma metamorfose constante, ora brusca ora sutil, mas que está sempre
ali. A jornada transforma você.
Isso
é a vida, mas o exemplo também serve para se analisar a carreira de algum
artista. Escritores, pintores, músicos, ou seja lá o que for. A inquietude é
uma constante de qualquer um que queria elevar o seu trabalho a algo maior que
o senso comum.
Eu
senti a necessidade de toda essa introdução pseudo-filosófica pra começar a
falar do disco novo do Paradise Lost, este fantástico The Plague Within, porque
olhando em retrospectiva, a carreira destes pioneiros do Gothic Metal britânico
foi uma jornada daquelas. Com muito mais curvas, montanhas e rios do que se
possa achar normal. Um caminho tortuoso, uma montanha russa. E The Plague
Within é o resultado disso.
Eu
pessoalmente acho um pouco exagerados os comentários quase eufóricos de algumas
pessoas dizendo que a banda voltou aos “bons tempos, às raízes”, que eles
quiserem se reaproximar do que haviam feito no final dos anos 80 com os seus
dois primeiros discos. Isso tudo me soa como uma intensa necessidade se
reafirmar toda a conversa mole de metal de verdade é isso ou aquilo, que
antigamente era melhor e blá blá blá.
É um disco
fenomenal, não me entendam mal, adorei cada segundo dele e de sua proposta, mas
eu entendo que ele é a evolução natural do que a banda vem fazendo desde Faith
Divides Us Death Unites Us (2009): o peso e a distorção com generosas doses de
melodia. Porém, com The Plague Within, nessa mistura é acrescida um “Death
Metal Edge”, como a banda comentou em várias entrevistas desde o fim do ano
passado. E é justamente isso, tudo um pouco mais lento e em tons mais baixos e
soturnos, com os vocais do Nick alternando entre a voz limpa e a voz mais
“rasgada” que poderia ser chamado de gutural com alguma boa vontade (que eu
adoro também, diga-se).
Está tudo ali,
em faixas como No Hope in Sight, Victim of the Past e Cry Out, absurdamente
pesadas e com riffs mórbidos que parem ter vindo diretamente do auge dos anos
90. Mas que também contam com a melodia característica do Paradise Lost século
XXI.
Já outras
faixas são realmente pancadas muito mais focadas no Death Metal Edge, como
Flesh From Bone, Sacrifice the Flame e Terminal, onde a banda consegue achar de
forma brilhante o espírito daqueles discos antigos, trabalhando ele em algo
novo e cheio de vida e vigor, fugindo da comodidade de simplesmente se repetir.
Mas o que o
disco oferece de mais impactante, na minha modesta opinião, é o resultado das
faixas que transitam sem muito comprometimento com uma coisa ou outra. Beneath
Broken Earth é um hino monolítico de dar inveja a QUALQUER banda de Doom Metal
que aposta no estilo desde que ele surgiu. Lenta, suja e claustrofóbica, uma
daquelas músicas que parecem um buraco negro que suga toda a alegria e cor do
mundo (desculpem, eu exagero).
Punishment
Through Time começa e termina com riffs que são algo como um enorme gancho que
se prende no meu peito e me levantam e depois me jogam para baixo outra vez
(desculpem de novo). No meio temos uma música enérgica, com flertes de
modernismo e uma atuação espetacular de Nick Holmes.
An Eternity of
Lies é a faixa mais “””alternativa””” do disco, por assim dizer. Tem toda uma
atmosfera diferente, como uma espécie de segunda voz quase fantasmagórica que
surge no refrão, que me faz pensar no disco Symbol of Life (2002). Mas não
carece de peso e densidade, sendo outro dos grandes destaques do disco.
E, por fim,
deixei para o final a última faixa do disco, que foi com toda a certeza a que
eu mais gostei. Return to the Sun é a síntese mais do que perfeita de tudo o
que eu falei nesse texto: o passado, o presente e o futuro se unem em algo
poderoso e grandioso, que saúda os dias de glória sem se perder em nostalgia
nociva. A forma mais adequada de fechar a audição.
Na jornada do
Paradise Lost, o ano de 2015 representou uma curva tão fechada que foi possível
dar uma espiada no ponto de partida. Mas isso, de maneira nenhuma, significa
dizer que eles voltaram para lá. Esses senhores não são mais aqueles garotos de
vinte e poucos anos, eles envelheceram, ficaram mais maduros, a vida os testou
e os transformou.
E essa jornada
vai continuar; a deles, a minha, a nossa. E quem sabe o que ainda está por vir
no caminho? Eu só sei que esperarei, com expectativa e ansiedade, os próximos
marcos dessa trajetória.
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