quarta-feira, 25 de julho de 2012

Trivialidades

É engraçado como às vezes algumas coisas absolutamente simplórias, bobas até, podem nos alegrar.

Hoje eu terminei de ler "Dublinenses", do James Joyce. No último (e brilhante) conto do livro, "Os Mortos", Gabriel vê sua esposa Gretta no alto de um balcão, com uma luz estranha de fundo, realçando seus cabelos cor de bronze, e com uma música melancólica ao fundo. Essa cena desperta uma alegria imensa em Gabriel, quase inexplicável para ele mesmo, se perdendo em lembranças belas do passado e desejou ser um pintor para poder imortalizar aquela cena em um quadro. Uma passagem de pura genialidade de Joyce (ainda mais pelo desfecho disso mais tarde), que com algo tão absurdamente trivial conseguiu desnudar algo tão marcante nas pessoas: o que as faz alegres.

Achei isso ainda mais marcante pois no mesmo momento que lia o conto lembrei de algo similar que aconteceu comigo mesmo. Semana passada, na segunda feira, eu estava no lado de fora do banco esperando a minha mãe sair. Fiquei uns bons vinte minutos ali parado, vendo a pacata vida feilizense passar. Mas em um dado momento, logo depois de conferido alguma bobagem qualquer no celular, cruzo ao acaso o olhar com o de uma guria que ia passando. Uma guria muito bonita, com olhos muito bonitos. Não conhecia ela, não sabia seu nome, muito menos de onde vinha e para onde iria. Mas ela me sorriu. Um sorriso tão sincero e despreocupado que me deixou meio bobo. Acho que devolvi com a mesma sinceridade. Um bom tempo depois dela ter sumido numa esquenia e continuava ali um tanto perplexo, mas me sentindo alegre. Afinal, não é todo dia que isso acontece.

Hoje, lendo o livro, acho que entendi o que aconteceu. O fato é que nós nos surpreendemos com a simplicidade dos atos sinceros e espontâneos. O mundo é opressor, a pressa nos devora e os compromissos consomem sem piedade nosso tempo. Não sobra tempo para a espontaneidade, para um cumprimento sincero, para captarmos uma cena ao acaso que nos marque profundamente, às vezes para simplesmente sorrir. Também as relações entre as pessoas sejam plastificadas demais, formais demais, uma mera necessidade social.

Como então não ficar perplexo e alegre com um ato desses?

Eu vejo que as pessoas dizem (e praticamente imploram) na internet que em uma relação precisa haver essas pequenas coisas simplórias, atos e gestos, surpreendentes. Mas quantas dessas que pedem isso o fazem? Geralmente o que se vê são dramas tolos, vazios, apenas reflexo da escravidão sentimental que impera neste século.

Sabem, aquele breve momento de não mais que cinco segundos me valeu o dia. Pode parecer bobagem, mas acreditem, é verdade. Eu queria que aquela guria pudesse passar os olhos por essas linhas e ler o meu sincero muito obrigado.