sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Liberdade?

Dias difíceis. Uma espera longa vai chegando no final, mas o caminho tem sido árduo, doloroso. Aos poucos vou conseguindo vislumbrar os contornos do semblante da liberdade, e cada dia que passa vou vendo mais longe todos os fantasmas que me atormentaram ao longo dos anos. Mas alguns deles continuam sem descanso, buscando me perseguir até o último instante. E o pior deles, sem sombra de dúvida, é a rejeição da família.

Eles nunca conseguiram me enganar com os elogios por ser bom aluno, por não causar problemas aos meus pais, por ser comportado e educado com as pessoas em geral. Tudo isso nada mais fora do que mentiras convenientes, bases da sólida e eterna hipocrisia que envolve essa instituição chamada família.
Olhares entregam muito mais sobre opiniões do que palavras. E foram tantos os olhares atravessados por causa de frases absolutamente simples, do tipo "Não obrigado, eu não gosto de beber". As palavras diziam "Tu tá certo" mas os olhos bradavam "Que viado idiota, nunca vai ser homem". Já há bastante tempo  tenho a convicção que não só os vizinhos da minha idade acham que sou homosexual, mas como também meus pais, meus tios, avós e primos. Nunca tiveram a honratez de me dizer isso na cara, mas seus pequenos gestos e códigos são mais claros que água cristalina. É duro dizer tudo isso, mas infelizmente é verdade.

Eu não diria que nasci no lugar errado. Não, estaria sendo injusto. De certa forma acredito que sou fruto desse meio, já que o fato de ser daqui aliado a várias pequenas circunstâncias moldou  minha personalidade eo meu jeito de ser; e por isso, dou é graças a Deus por ter nascido aqui. Em outro lugar, acho que não seria o que sou. E apesar de todos os meus defeitos, gosto do que sou.
Não posso dizer que meus familiares sejam pessoas ruins, muito pelo contrário, são pessoas que tem índole, caráter, mas que se deixam dominar por preceitos culturais que entendem como verdades absolutas, e que acabam tendo um preconceito intrínseco com o que é diferente do que entendem ser o certo. Essa ideia toda soa um tanto incoerente, mas é assim mesmo, o preconceito de quem vive praticamente isolado em pequenas colônias germânicas parte muito mais por inércia cultural do que por maldade.

Mas bem, isso não significa que não machuque. Passei minha vida inteira sendo recriminado por coisas fúteis, nunca tive apoio para nada e quase sempre recebia risadas ou olhares de deboche quando dizia que queria ir além nos estudos. Muito mais de uma vez que ouvi conselhos para esquecer essa coisa de estudar e ficar na roça, que eu iria era mesmo me quebrar a cara e voltar pra casa com o rabo no meio das pernas, que me toranria um igual a eles.
No dia que fico sabendo que consegui entrar na Universidade Federal de Pelotas recebo mil parabenizações, grandes elogios; nenhum sincero. Meu pai não disse nada, me enganei achando que ele tinha me olhado com orgulho, já que o que eu entendi por orgulho era um tipo estranho de inconformação. Ele  nunca tentou me desmotivar, mas também jamais me deu uma palavra de incentivo. Alguns dias atrás estava indo para o centro com ele, quando passou na estrada um cara um ou dois anos mais velho que eu, o perfeito colono, que se acaba na roça, comprou uma moto aos 17, não terminou o ensino médio e que passa o fim de semana de porre. Meu pai então buzinou, gritou, um verdeiro carnaval, com um grande sorriso no rosto. Uns dois minutos depois fiz um pergunta qualquer, e de resposta ganhei grosseria e uma cara fechada. Bem, não é difícil imaginar quem ele preferiria como filho.

Mas domingo eu vou embora. Vou deixar tudo isso para trás. Óbvio que vão continuar falando mal de mim, mas só o fato de eu ir pra longe, de ter conseguido o que nínguem aqui conseguiu, de ter provado que era capaz, já me tem sabor de vitória.
Saudade vai ser algo presente, claro que sim, não vou ser doente mental de afirmar que não sentiria saudade. Mas o sentimento de poder começar um vida nova, sem precisar sair dizendo por todo lado "sou o filho do fulano", "primo do siclano" e afins, sendo eu mesmo, é algo que vai compensar qualquer falta que uma família que não gosta de mim virá a fazer.
Saudade mesmo eu vou sentir dos meus poucos mais verdadeiros amigos. Amigos no sentido pleno da palavra. Pessoas que me aceitaram, que me ouviram, que me entendem, que não me julgam. De vocês, meus caros, a saudade será crucidante.

Enfim, só espero que essas palavras todas não soem como choradeira, não foi essa a intenção. No máximo um desabafo, de coisas que eu andava guardando dentro da cabeça há tempo demais, e que vinham sendo pesadas demais.

Não sei se será uma liberdade plena, mas de qualquer modo, começo a traçar meu próprio caminho.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Romances ingleses

Romances ingleses: esses dias cheguei a conclusão de que exagerei neles.

Fiz uma pergunta qualquer para o meu pai, e por seu comum jeito irritadiço me respondeu um tanto grossamente. Quando ele fez isso acabei me lembrando de uma passagem de um romance inglês onde um distinto nobre sacaneia enormemente um americano um tanto idiota. A forma como ele falava era polida, cínica, fria e absolutamente intimidadora, mas sem mostrar qualquer coisa parecida com algum resquício de irritação. Fiquei imaginando por que é tão complicado para a maioria das pessoas ao menos parecer ser educada, tendo um mínimo de polidez e calma. Eu tento ser assim.

Ontem passei algumas horas de ócio na biblioteca pública da Feliz, e reli uma boa parte de um ótimo romance inglês chamado "Os Senhores de Cashelmara", de Susan Howatch. Um grandioso épico familiar que passa por 50 anos e três gerações de uma importante família da corte britância. Li esse livro em 2006, tinha o achado maravilhoso, e continuei achando quando vi ele de novo parado na mesa estante tanto tempo depois. E relendo algumas passagens acabei me dando conta de uma coisa: sou quase um britânico. Peu jeito polido, um tanto frio, fleumático de certa forma. No exato momento não me dei conta do porquê, daí fiquei fantasiando sobre o tema.  Reparando nisso parei para pensar na quantida enorme de romances de origem inglesa que eu já li.

Já me perguntei algumas vezes por que diabos sou tão frio pra vida desde que comecei a me preocupar com isso. Pensava, pensava e pensava e não conseguia chegar a nenhuma conclusão. Mas então, ontem, relendo aquele livro, tudo ficou claro como água cristalina: romances ingleses. Li dezenas deles, muita coisa mesmo, tantos que por osmose acabei absorvendo o jeito de ser dos britânicos. Mesmo histórias de amor mais acaloradas acabam tendo uma dose pesada de fleuma, de dureza, de estoicismo. Acabei me vendo naquelas páginas amareladas.
Sem querer notei outra coisa: nunca gostei de histórias de amor tórridas, quentes, de "sangue-latino", assim digamos. Sempre tive uma atração maior por coisas que tivessem um cunho racional mais forte em evidencia, contrastando com o sentimentalismo. De certa forma, acredito que isso foi uma forma inconsciente de me identificar, me sentir mais próximo da trama, por nunca conseguir entender os meandros daquilo que os poetas costumam chamar de "coisas do coração".

De que me serviu isso? Provavelmente nada, porque teoricamente eu já deveria saber disso tudo, minha neurose incontrolável me obriga a achar que tenho a obrigação de entender tudo por conta própria. Mas enfim, como ultimamente ando sendo mais aberto a pensar em sentimentalismo e coisas do gênero, acabou sendo interessante essa descoberta de auto-conhecimento.

E no mais, eu adoro romances ingleses, e nem penso em larga-los.

domingo, 1 de agosto de 2010

O Abraço que Sufoca

Esse post terá por tema dois ítens: o marco histórico para a América Latina que foi a liberação do casamento entre pessoas do mesmo sexo na Argentina, e também a forma como uma antíquissima e poderosa organização vê este caso naquele país (E de certa forma no resto do mundo também).

O que aconteceu na Argentina foi um passo gigantesco para que algum dia se alcance a quase útopica igualdade de direitos civís para os homosexuais. O preconceito é uma chaga que acompanha o homem desde seus primórdios intelectuais, e que foi o estopim de muitas geurras, violência gratuita, maldades, sofrimentos, banhos de sangue e um sem fim de atrocidades protagonizadas pela humanidade. E isso não se aplica unicamente no que diz respeito a homossexuais, englobando também religião, classe social, aparência, ideologias políticas, etc...
A homosexualidade (convenhamos, quem usa o termo 'homosexualismo' merece levar um tiro) é algo sim natural, e querer excluir quem seja assim da sociedade demonstra o quão baixo o ser humano ainda rasteja na sua primitividade intelectual. Pois bem, a Argentina merece todas as parabenizações, por ter dado um passo devéras importante rumo à civilidade verdadeira.

Segundo ponto (De fato será mais extenso e ácido): a Igreja Católica não merece muito respeito.
Mas antes de mais nada devo deixar clara uma coisa: jamais vou afirmar que todos os membros dessa instituição são crápulas e seres despresíveis; não, nunca faria isso, já que estaria sendo cego para vários atos de bondade e compaixão que pessoas decentes já prestaram  para seus semelhantes.
Mas se formos analisar mais friamente, acharemos dúzias de exemplos nos quais comprovaremos a completa decadência de tal instituição organizada. Os livros de história podem ser sim manipuláveis, mas o fato é que eles nos empilham dezenas de citações que dão alguma verossimilhança a essa tese, com exemplos de manipulação, extorsão, assassinatos, genocídios, estupros, e uma longa lista de atributos nada elogiáveis. 

"Nenhum reino nunca derramou tanto sangue quanto o reino de Cristo." Essa frase é de Montesquieu, um iluminista francês bastante desgostoso com os preceitos da igreja cristã em geral. Soa forte, para uns um tanto exagerada; mas não podemos negar que há muita verdade nela.Guerras Santas mataram um número gigantesco de pessoas inocentes, defendendo a bandeira da "salvação" promvida pela palavra de Deus e ensinamentos de Jesus escritos naquele grande livro de ficção, a Bíblia. Bandeira que nunca mais foi que um disfarçe indubitável diante das ameaças de danação no fogo do inferno, escondendo por trás de si unicamente o interesse de dominar valiosas rotas de comércio do oriente para o ocidente. 
No Evangelho de Mateus, Capítulo 6, versículo 24 diz: "Não podeis servir a Deus e ao dinheiro". Ora, como eu posso levar a sério uma instituição que prega uma coisa, mas que seu maior interesse é exatamente o oposto? 


Religião, como um todo (E que decididamente difere de religiosidade), é um abraço que sufoca. Ela te oferece conforto, calor, um alento nos momentos de dificuldade. Muito bem, nada de errado nisso, mas o problema é que as exigências para se ter esse conforto são sufocadoras e opressoras, você tem que se dedicar unicamente a louvar ídolos físicos ou não, entregar sua atenção (E muitas vezes dinheiros e bens) aos "intermediários" das doutrinas. Teoricamente, seguidndo fielmente uma religião você se torna um escravo, um tolo dançarino que diverte alguem. 


Como a igreja católica (Ou qualquer outra, aliás) tem a petulância e a altivez de querer falar por Deus? Apoiar-se numa colcha de retalhos histórica e étnica como a Bíblia não é um argumento. Esse livro é o resultado de mais de 4 mil anos de relatos de vários povos, que foi se modificando ao longo dos séculos, e e vou acreditar nisso até o dia em que alguem for capaz de me provar que Deus mandou-a para a Terra via fax. Portanto, acho o fato de essa instituição condenar a homosexualidade a mais grossa e doentia das hipocrisias. Não posso crer que um Deus anunciado como fonte infinita de bondade e que sempre irá perdoar seus filhos, seja esse ser vingativo e que queira punir suas criações com condenações e castigos terríveis. 
A pureza e a virgindade da religiosidade foram perdidas a muito tempo, transformando o silêncio eterno da opressão como via de regra. E o perdão está a venda....


Enfim, não defendo filosofias de alguma organização. Não quero matar Deus e muito menos provar que ele existe. Eu simplesmente quero um mínimo de lógica, de coerência, um facho de luz em meio à cegueira, que deixemos de ser animais estúpidos e nos tornemos realmente seres humanos livres e pensantes, acabando com os grilhões da ignorância e da opressão mesquinha. 

O título deste escrito é referência a saga "The Embrace The Smothers", composta pelo músico holandês Mark Jansen, em suas bandas After Forever e Epica.






Post dedicado a uma grande amiga minha.