Muita
gente por aí vem dizendo que George RR Martin não tem mais interesse em As
Crônicas de Gelo e Fogo e Westeros, pois entrega muito do seu tempo a outros
projetos e aparentemente não coloca todo o seu foco na produção do próximo
volume da saga. Tolas crianças do verão...
Terminei
de ler The Princess and the Queen, nova novela do autor que se passa em
Westeros, durante a sangrenta guerra civil conhecida como A Dança dos Dragões*,
que dividiu a família Targaryen e destruiu com praticamente com todos os dragões.
A história se encontra na gigante coletânea multigênero Dangerous Women,
editada pelo George em conjunto com seu parceiro de longa data, Gardner Dozois,
mais um dessas empreitadas que irritam fãs mundo a fora. Eu, pessoalmente,
nunca deixei de acreditar no nosso amigo barbudo do Novo México, mas essa
história me fez ter toda uma nova expectativa para como vindouro The Winds of
Winter.
Você
pode achar que a criatividade doentia e sangrenta do autor atingiu seu ápice no
aclamado A Tormenta de Espadas. Lego engano, camarada. The Princess and The
Queen, em suas menos de cem páginas, tem tanto sangue quanto os romances da
saga principal. Tem traição, tem intrigas, tem manipulações e tudo mais do que
nós tanto amamos. E o melhor de tudo: tem DRAGÕES. Muitos dragões.
Os
dragões de Daenerys são um dos grandes atrativos da saga, sem dúvidas. Porém
eles são jovens, pequenos e mal utilizados ainda por sua dona. Nem sombras são
dos seus antepassados, as monstruosas feras aladas que Aegon o Conquistador usou
para subjugar Westeros. Mas agora, George nos presenteia com uma narrativa que
garante grande enfoque às criaturas, mostrando toda sua ferocidade, poder e
magia. As batalhas no ar entre os dragões e seus cavaleiros são de uma
grandiosidade impressionante. Realmente de tirar o fôlego e arregalar os olhos.
E isso demonstra como George é um excelente contador de histórias.
Quando
fiquei sabendo que a novela seria em forma de um relato escrito por um
arquimeistre da Cidadela, fiquei com o pé atrás. Bem atrás. Honestamente,
fiquei com algum medo. Porém, poucas páginas depois de começar a ler, não só
entendi a escolha como também a achei perfeita. Se fosse pelo estilo
tradicional, pelo ponto de vista dos personagens, a história precisaria de um
livro inteiro e tão grande quanto os demais para ser contada. Já o relato do
arquimeistre reúne os fatos conhecidos e relatados por outros meistres e
escribas diversos, as incertezas e dúvidas sobre como as coisas realmente se
desenrolaram, e questiona versões populares sobre os eventos, dando um panorama
suficientemente profundo do conflito sem a necessidade mergulhar completamente
nele. Ainda mais que a narrativa conta com aquelas piadas, ironias e ditos de nobres
e plebeus que deixam a prosa tão cativante e divertida, mesmo com as descrições
mais sangrentas e brutais de uma guerra insanamente cruel.
Além
disso, há de se louvar essa incitativa de expandir temporalmente a história dos
Sete Reinos. Os contos de Dunk and Egg deram início a esse processo, voltando
noventa anos no tempo e nos dando toda uma nova percepção sobre Westeros, seu
povo e seus senhores. Em The Hedge Knight, vemos acontecer algo que é citado em
A Fúria dos Reis, quando o Lorde Comandante dá uma breve lição de história para
Jon Snow na Muralha. Já em The Sworn Sword, aprendemos muito mais sobre a
rebelião Blackfyre. Por sua vez, The Mystery Knight o fracasso de uma nova
tentativa de rebelião e nos apresenta um intrigante personagem que voltaríamos
a ver mais tarde. O que tínhamos ouvido da boca dos personagens d’As Crônicas.A
História westerosi sendo costurada e tecida em uma grande tapeçaria.
História.
Mas uma História colorida, viva, cheia de emoções. George vai aos poucos
consolidando seu universo como algo concreto, vívido, crível. Eu sempre
enxerguei os personagens como seu maior trunfo, mas agora, com The Princess and
the Queen juntamente com as aventuras do cavaleiro muito alto e do menino
careca, o universo se equipara aos personagens, ou melhor, se fundem e se
tornam indeléveis.
Agora
me digam: um escritor que perdeu o interesse em sua maior obra faria tudo isso?
Engrandeceria seu mundo a um nível ainda maior? Empenhar-se-ia horas e mais
horas nesse objetivo? Presentearia seus fãs com algo tão bom e excitante?
Eu
acho que não.
Por
isso tudo, as minhas expectativas quanto a The Winds of Winter não poderiam ser
maiores. Aumentou-se o que já era grande.
George
não perdeu a mão, muito longe disso. Trilhou um caminho tortuoso em O Festim dos
Corvos e A Dança dos Dragões, pois depois de A Tormenta de Espadas, ele se
deparou com uma história imensamente grande e complexa, tanto que acabou se
dando conta que não conseguiria chegar aos seus objetivos como planejara, e por
isso um longo desvio com o pé fundo no freio se fez necessário.
Observando
com atenção os acontecimentos dos dois últimos livros lançados, pode-se
vislumbrar algo grande se
aproximando, aquilo que George havia imaginado, finalmente tomando corpo. Infelizmente
ele tinha nas mãos um nó meerense e não um górdio, e por isso não poderia usar
uma solução Alexandrina.
Mas,
ao que tudo indica, vai valer a pena esperar. E como vai.
* Vale fazer nota que não tem
qualquer relação com o quinto livro d’As Crônicas, o qual o título original em
inglês é A Dance With Dragons, cuja tradução literal seria Uma dança com
Dragões.
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